Sexo nas alturas: o que está por trás do fetiche de transar em aviões
Felipe Lessa com supervisão de Nathalia Ferreira / Redação RedeTV!De cenas discretas no banheiro a prisões em pleno voo, especialistas e um fetichista revelam os bastidores da fantasia que intriga passageiros e preocupa autoridades
(Foto: Reprodução/ Redes sociais)
O Mile High Club surgiu nos Estados Unidos, nos anos 1920, para se referir a pessoas que já fizeram sexo a mais de uma milha de altitude (cerca de 1,6 km). Desde então, virou sinônimo de aventura sexual em aviões — tanto em jatos privados quanto em voos comerciais.
Imortalizado por filmes, séries e videoclipes, o termo ganhou popularidade nas redes sociais, onde vídeos de supostos “novos membros” circulam com frequência.
A psicóloga e sexóloga Fernanda Purificação ressalta que a imagem do Mile High Club é alimentada pela própria cultura pop: “Essa fantasia é constantemente reforçada por filmes e séries. Para muitas pessoas, embarcar num avião é entrar em um cenário que já viram como palco de uma transgressão”.
Em julho de 2025, um voo da JetBlue, nos Estados Unidos, foi cenário de polêmica quando um casal de Connecticut foi preso após fazer sexo em seus assentos, à vista de duas crianças. A mãe dos menores acionou a tripulação e a polícia aguardou o desembarque. Eles foram acusados de “exibição lasciva diante de menores” — crime que pode resultar em multa e prisão.
Já no Brasil, em junho de 2024, um advogado foi detido pela Polícia Federal após ser flagrado se masturbando ao lado de uma passageira, no voo entre Brasília e São Luís. Um delegado que estava a bordo deu voz de prisão e o homem foi conduzido ao desembarcar.
O advogado criminalista Arthur Matos explica que esses episódios não são isolados: “A cada ano surgem registros de comportamentos inadequados em voos. Alguns ganham repercussão pela gravidade ou por envolver pessoas conhecidas. No Brasil, a Polícia Federal tem atuado com mais rigor nesses casos”.
Já o psicólogo clínico André Sena Machado pontua que o avião desperta o imaginário por ser um ambiente completamente diferente da rotina. “O avião representa uma suspensão da realidade cotidiana. É um momento em que as pessoas estão literalmente fora do chão, desconectadas das responsabilidades. Isso transforma o voo em um palco para fantasias, onde o risco intensifica o desejo.”
Para a neuropsicóloga Aline Rezende Graffiette, o fator biológico também é importante: “A excitação não está ligada à adrenalina, como muitos imaginam. O neurotransmissor mais envolvido nesse prazer imediato é a dopamina, ligada à busca por recompensas rápidas.”
Todavia, segundo a psicóloga Fernanda Purificação, nem todo caso é um fetiche: “No fetiche, o prazer está condicionado à situação ou objeto. Na fantasia, é um tempero que pode apimentar a relação. Muitas pessoas sentem vontade de transar em um avião sem que isso seja determinante para seu prazer sexual”.
Ainda sim, Machado acrescenta que, independentemente de ser fantasia ou fetiche, a busca pela experiência pode ser explicada pela quebra de regras. “O espaço aéreo tem normas rígidas e vigilância constante. O ato de transgredir em um local assim potencializa a excitação”, esclarece.
É crime?
De acordo com o advogado Arthur Matos, sexo em aeronaves comerciais pode configurar crimes como ato obsceno, importunação sexual e até atentado contra a segurança do transporte aéreo. “Mesmo consensual, se houver exposição a terceiros, como passageiros ou tripulantes, pode haver enquadramento penal. O banheiro, embora pareça privado, também é considerado espaço de uso coletivo”, explica.
Ao ‘Portal da RedeTV!’, o produtor cultural e fetichista Heitor Werneck relata que a atração por fetiches sempre fez parte de sua vida e que o ambiente do avião oferece um estímulo único: “O avião é sexy por todos os sentidos. Você está ali com 40, 60, 100 pessoas que não conhece... num ambiente de tensão, pressurização, cheiros, corpos... e milhões de possibilidades. Realizar isso é excitante porque ninguém pensa que duas pessoas podem estar se curtindo naquele momento”.
Para ele, o que diferencia a fantasia do fetiche é o papel do ambiente: “O banheiro, a poltrona, o contexto todo... É diferente de só matar um desejo rápido”.
Werneck conta que já fez sexo cinco vezes em aviões, mas o interesse por transgressão vai muito além das alturas: “Eu sempre estou fazendo sexo em lugares que não podem fazer e que são maravilhosos porque eu tenho essa coisa de explorar o desconhecido, explorar limites, explorar corpo e explorar meu limite. Já fiz sexo em cemitérios, necrotérios, igrejas, trens, dentro de Uber... cavernas, montanhas, floresta, em cima de montanha, em grutas. Explorar lugares novos é seguir a minha regra. Só o orgasmo salva. Eu não quebro regras, eu torno aquele lugar sexy. Escritórios, consultórios médicos, advocacia... tudo pode ser um lugar para uma nova experiência sexual e de vida”.
Em seus relatos, ele descreve duas experiências marcantes dentro de aviões:
“Uma foi com uma passageira. Estávamos na classe econômica e, no voo noturno, o assento ao lado dela estava vazio. Acendemos as luzes discretamente, trocamos olhares e sinais. Mudei de lugar, fui ao banheiro e sentei ao lado dela. Fizemos sexo oral ali, de maneira silenciosa, e depois cada um seguiu viagem como se nada tivesse acontecido”.
“Outra foi com um comissário. Fiquei encantado com o corpo e o olhar dele. Trocamos olhares e, quando todos dormiam, acendi a luz. Ele perguntou se eu precisava de algo. Eu sinalizei que sim e fui ao banheiro. Ele veio atrás e transamos intensamente”.
Além das experiências pessoais, Werneck aponta que existe uma comunidade de entusiastas do Mile High Club, ainda que discreta: “Existe comunidade no Facebook, Instagram, Telegram. A maioria não se identifica, só narra experiências. Para alguns é ocasional, para outros é recorrente. É um fetiche que circula silenciosamente, mas com muitos adeptos.”
Ele também menciona festas internacionais que exploram a liberdade sexual: “Há eventos famosos como o Folsom Street Fair, em São Francisco, e festas em Berlim, que celebram o sexo em espaços públicos. No Brasil, há festas de fetiche e swing que reúnem milhares de pessoas. Isso sempre gerou polêmica, como no caso recente no Rio de Janeiro, mas esses encontros fazem parte da história. Desde os rituais pagãos de Dionísio até bacanais romanos, a celebração do corpo sempre existiu.”
Fique informado com a RedeTV!
- Clique aqui para entrar no nosso canal de notícias no WhatsApp